esta agora...
28.7.03
Porque será que nenhum jornalista se atreve a fazer perguntas incómodas a paulo portas? Passaram já uns dias sobre a demissão do responsável máximo pelo exército português e percebemos já todos nós que o ministro da defesa o empurrou para essa decisão com actos e gestos muito pouco dignos. Nada de novo, nada de surpreendente. Pois sim. Mas porque é que ninguém lhe pergunta se tentou mesmo promover um dos homens do seu gabinete nas fileiras do exército. E porque é que ninguém lhe pergunta porque não esteve presente nas comemorações do dia do exército, optando por assistir, no mesmo dia, a um acto militar de menor importância. É sabido que o nosso Alastair Campbellzinho é um mestre na utilização dos media. É sabido, também, que se fez rodear de jornalistas profissionais muito competentes. Acho, porém, que tanto talento junto deveria, certamente, ser confrontado com posturas mais curiosas e menos conformadas, por parte dos profissionais da comunicação.
25.7.03
O acontece vai acabar. O senhor almerindo fez o anúncio - a julgar pelas palavras de carlos pinto coelho - sem sequer ter falado com o autor do programa. Será sinal dos tempos, mas é também - a confirmar-se esta versão - sinal de carácter pouco consistente do dito administrador. O acontece tinha, indubitavelmente, algumas falhas graves; padecia de excessiva centralização e era, em alguns casos, muito circular nos conteúdos abordados e nas figuras que escolhia para destacar (sem dúvida, resultado claro da influência que o chamado 'conselho permanente de sábios' - creio que quase todos homens e todos de lisboa - tinha sobre carlos pinto coelho).
Mas o acontece era também único e raro. Único porque insistia em aplicar a temas culturais linguagens não aborrecidas, sem que isso significasse perda substancial de conteúdo. Raro porque não existe nada que se assemelhe. Vai fazer-me falta aquele espaço de episódica surpresa nos momentos de algum descanso depois do jantar. E vai fazer-me falta aquele estilo, aquela energia.
24.7.03
O documento hoje publicado no dn, da responsabilidade de figuras proeminentes da nossa vida política (como mário soares, freitas do amaral, leonor beleza, entre outros) é, em abstracto, um exercício compacto e pertinente de cidadania. Parece-me, de facto, injustificável que seja possível, em democracia, manter um indivíduo preso preventivamente por mais tempo do que se permitia no tempo do regime autoritário. É igualmente inaceitável que uma lei subalterna possa subverter um enunciado constitucional de garantias de defesa de um arguido. Em abstracto, como disse, parece-me um documento sóbrio e pertinente. Só que, na vida, muito pouco acontece no reino do abstracto. As coisas não são nunca só e apenas as coisas. São sempre as coisas...e o seu contexto. Ora, apesar de tentarem ressalvar que esta sua posição não é despoletada por nenhum caso particular, é por demais evidente que essa avaliação exagera na sobriedade. E isto aborrece-me profundamente. Temos um conjunto de leis deliberadamente vagas e permissivas a inúmeras interpretações precisamente para que alguém disso faça uso. Temos enquadramentos de garantias de direitos de defesa dos cidadãos claramente insuficientes. Mas nada disto é novo e tudo isto já existia ou (mais grave) foi construído em períodos nos quais alguns dos signatários tiveram importantes responsabilidades de estado. Nenhum deles me pareceu, nestes anos todos, preocupado com o facto de pequenos delinquentes de rua serem detidos preventivamente sem sequer conhecerem o seu advogado.
Estes ilustres preocupam-se agora. Dir-se-á que mais vale tarde - aceito. Mas não tentem iludir-nos. Se eu fosse cínico diria até que a mesma clique que elabora legislação para auto-defesa, posta agora perante uma das raras brechas no paradigma, inicia movimentações para, precisamente, se auto-defender. Isto, claro, se eu fosse mesmo muito cínico.
23.7.03
Ouvi há pouco, na tsf, um comunicado da administração da empresa onde se anunciava que carlos andrade deixou de ser o director da estação. Não me surpreende que a lusomundo se mantenha fiel à sua estratégia de (à excepção do dn....e sempre com a pergunta 'até quando?' no ar) preferir ter à frente dos seus projectos pessoas com menos história e com menos peso no meio. O capataz granadeiro faz muito bem o seu serviço de 'gestão sorrateira' (ou, se preferirmos, de gestão 'por desgaste') das situações que incomodam ou perturbam a lógica comercial dos senhores que, lá em cima, tratam tudo com números. Sofre a tsf, porque perde um 'senhor' (apropriando-me aqui, com a devida vénia, de uma expressão popular sincera e honesta na sua celebração de carácter) e sofremos nós, os ouvintes, porque sem darmos conta disso a tsf vai mudar. Talvez vá fazer o mesmo, mas com menos recursos, menos gente, menos respeito pelo trabalho dos profissionais e menos garantias de estabilidade no emprego. E só os patrões do capataz granadeiro podem interpretar isto como um avanço.
A conferência de imprensa dada esta tarde, em bagdade, pelo tenente-general sanchez, em nome das forças da coligação que controlam miltarmente o iraque trouxe-nos poucos mais pormenores sobre a operação de ontem, em mosul. Parece-me, no entanto, interessante salvar de tão orquestrada encenação a postura de um jornalista árabe (peço desculpa por não lhe conhecer a nacionalidade) que, de uma só vez, presenteou o militar com as três únicas perguntas que se impunham neste momento: tendo em conta a importância estratégica dos dois filhos de saddam, não teria sido importante capturá-los com vida? Como operação militar foi um falhanço (dada a desproporção de meios usados para deter três homens e uma criança)? Confirma-se a morte de um dos netos de Saddam?.
Sanchez defendeu-se da forma convictamente atabalhoada que só se reconhece nos chefes militares e, daí em diante, a conferência morreu.
Se mais não nos deu este conflito, mostrou-nos no mínimo que - apesar de enormes pressões e contingências - há excelentes jornalistas fora do mundo fechado (e controlado) dos ditos media ocidentais. E isso só pode ser positivo.
22.7.03
O já chamado 'Kellygate' vai ocupar as atenções dos meios de comunicação britânicos pelo menos até à publicação dos resultuados do inquérito judicial (talvez em Setembro) mas dá-nos já pistas para alguma reflexão sobre a conduta de funcionários do estado, sobre a forma como - em ambientes de crescente pressão - se elaboram notícias, sobre a forma como um cidadão envolvido numa disputa entre grandes poderes chega ao ponto de se suicidar ou - em tom mais polémico - sobre a perfeição quase orquestrada do local onde se encontrou o corpo do cientista.
Uma coisa continua a parecer-me clara - os directores de comunicação fazem menos do que pensam pelos seus líderes e fazem mais do que imaginam pela degradação do suporte social das democracias.
Vi, esta noite, o deabte sobre blogs no novo programa do francisco josé viegas, na ntv. Foi interessante, apesar de o apresentador não ter nunca aproveitado caminhos abertos pelos entrevistados para falar noutros assuntos. Percebo que, num programa daqueles, talvez se impusesse a insistência nos livros, mas não lhe fazia mal nenhum ter permitido mais liberdade à conversa...em fidelidade ao espírito dos blogs.
Vi hoje, com algum desconforto, mais uma intervenção do senhor avelino ferreira torres num dos canais nacionais de televisão. Duas notas apenas: a primeira sobre a figuraça e a segunda sobre o papel dos jornalistas. Vamos então ao dito - absoluto desconhecedor de qualquer dos significados da palavra vergonha o senhor torres sente-se no direito de, com admirável persistência, nos insultar a todos por falha de inteligência. Desta vez, por entre alusões à folclórica justiça de fafe, disse o referido indivíduo que só apresentava um novo recurso porque o seu advogado queria. Ou seja, à falta de melhor recorre-se à táctica do "não fui eu....foi ele". É lamentável que um homem destes possa ter qualquer papel de relevo na vida política do país e é lamentável que se continue a dar-lhe espaço para as suas diatribes. E aqui entra a segunda nota. Caberá aos editores não enviar estagiários para recolher testemunhos de tão ilustre figura mas cabe também ao jornalista (com muita ou pouca experiência) preparar-se para o que vai fazer. Neste caso, perante tão volumosa torrente de disparates, impunham-se interpelações. Simples. Várias. Muitos jornalistas parecem esquecer-se de que, perante a lei, são co-responsáveis pelas declarações de terceiros transmitidas/publicadas no seu orgão de informação.
19.7.03
O primeiro-ministro britanico, Tony Blair, abusa dos chamados 'spin doctors' e, como frequentemente acontece com tácticas arriscadas, a situaçao complica-se para alem do dominavel.
A misteriosa morte de David Kelly, alem de ter naturalmente acabado com a euforia que so Tony sente depois de mais uma sessao de falsa equiparacao ao 'grande lider do mundo dos justos', podera assinalar o inicio da queda de mais um ministro reconhecido pelos seus multiplos talentos de criador / desactivador de factos, eventos, boatos ou simples sussurros.
Depois de Peter Mendelson, logo no Ãinicio do seu primeiro mandato como primeiro-ministro, podera muito bem caber agora a Alastair Campbell, o director de comunicacao do executivo de Blair, o estafado papel de se demitir por razoes pessoais.
Como escrevem no Guardian de hoje Ewen MacAskill e David Leigh, Campbell transformou em obsessao uma disputa com um jornalista da BBC sobre o papel que o governo tera tido no adocicar de um dossier elaborado em Setembro do ano passado e que tera constituido factor determinante na decisao de avancar para uma invasao do Iraque. O jornalista, Andrew Gilligan, disse ter falado com uma fonte que lhe garantiu que Campbell empolou o documento. Nao contente com uma negacao das alegacoes, Campbell apostou numa tactica arriscada - descobrir a fonte, apertar com ela e tentar (a boa maneira de Sir Humphrey) humilhar a BBC com um pronunciamento escrito explicito sobre David Kelly. Como a (tao pouco) estatal corporation nao cedeu, o nome de Kelly veio misteriosamente parar aos jornais e seguiu-se uma inquiricao parlamentar vergonhosa. O reputado cientista foi humilhado pela simples razao de que um membro do governo precisava de salvar a face. Um homem serio foi trucidado por inquisidores profissionais, tao mais atentos ao papel de um ex-inspector da ONU na passagem de informacoes a um jornalista do que aos factos graves a que a noticia fazia referencia. Kelly saiu destrocado do Parlamento e Campbell voltou a casa contente com o servico prestado ao paÃis em mais um dia normal de trabalho.
A morte de David Kelly - de um so sopro - tranformou vitoria em, pelo menos, meia derrota. Tony Blair talvez tenha que pedir a mais um dos seus brilhantes (no sentido mais espiralmente destrutivo da palavra) ajudantes de campo que faca o favor de saiÂr de cena. Campbell ficara uns meses longe dos holofotes que tao bem sabe manejar e reaparecera, depois disso, em circunstancias pacificas, como o candidato natural a uma qualquer missao externa, a uma qualquer posicao politica de centralidade inferior ou ate mesmo a um qualquer cargo numa organizacao internacional. Kelly, esse, podera vir a ser estudado como um case study numa qualquer universidade de comunicacao. Pouco mais. E isso diz-nos muito sobre as fragilidades do sistema democratico.
A aventura começa. E começa com um enunciado breve de regras de conduta: aqui se falará, sobretudo, de dois mundos - a polÃtica e a comunicação - optando pelo comodismo de acompanhar a actualidade. EspÃrito crÃtico e mordaz qb. Reflexão - tanto quanto possÃvel - fundamentada e aberta a discussão coerente.
Ora então, cá vai.